Aquele ali, se esquentando
Que parece estar dormindo
É o velho seu Esmilindro
Que ao pé do fogo se esconde
Quando lhe falam, responde
Mas senão, vive calado
Olhar triste, entrecerrado
Perdido, não sei onde!
É desses índios de estância
Que ninguém conhece o drama
Tem só os arreios da cama
E um poncho velho que o cobre
E embora nunca se dobre
Nem ao guascaço mais duro
Pouco lhe importa o futuro
Pois já nasceu pra ser pobre!
Conhece de tudo um pouco
Trança, laça e gineteia
Não fala da vida alheia
Nem se mete em discussão
E já ao primeiro clarão
A estrela d'alva saindo
Encontra o velho Esmilindro
De pé, batendo tição!
É quem recolhe os cavalos
Bem antes que o dia venha
Puxa água e corta lenha
Pra as chinocas da cozinha
É quem cuida de galinha
E dá quirera pra pinto
Sabe tudo por instinto
E o que não sabe, adivinha!
Surgiu um dia na estância
Ao tranco dum baio-ruano
E ficou, passou-se um ano
Foi ficando, até ficar
E ao fim de tanto penar
Só tem, além da ossamenta
Esse fogo onde se esquenta
E esse galpão que é o seu lar
A ninguém diz de onde veio
Nem tampouco pra onde vai
Não tem mãe, nem teve pai
Que lhe acolherasse um nome
E à medida que se some
No tremendal da amargura
Vai vendo que sem ternura
As almas morrem de fome
Por isso é que ao pé do fogo
Cabisbaixo e silencioso
Vive a pensar no repouso
Da cruz do campo, sozinha
Quando ali de tardezinha
O vento for repetindo
Dorme aqui um tal de Esmilindro
Que nem sobrenome tinha!